24 de setembro de 2014

"O corpo tem degraus, todos eles inclinados
milhares de lembranças do que lhe aconteceu
tem filiação, geometria
um desabamento que começa do avesso
e formas que ninguém ouve
O corpo nunca é o mesmo
ainda quando se repete:
de onde vem este abraço que toca no outro,
de onde vêm estas pernas entrelaçadas
como alcanço este pé que coloco adiante?
Não aprendo com o corpo a levantar-me,
aprendo a cair e a perguntar."

José Tolentino Mendonça, in "Estação Central"

16 de setembro de 2014

Resta-me abraçar-te em suspenso.
Como quando te privas do ar.
Exactamente quando inspiras fundo e permaneces assim... pendente.
Os segundos que se apartam uns dos outros.
Talvez seja isso que nos resta. Abraçar-te em suspenso.
Para que te encontres. Para que perdure. Só mais um pouco.

15 de setembro de 2014

Cobres-me os poros de uma tinta opaca.
Desenhas com as pontas dos dedos coisas imperceptíveis. Letras. Símbolos. Códigos.
Cegas-me com a luz que emanas quando o teu olhar me procura. Por entre o teu corpo. Escondida.
Acredita que me ensurdeces quando da tua boca saem melodias estranhas. Palavras esquivas. Sons obtusos.
É precisamente o me seres estranho que me dá abrigo.
E gosto. Gosto-te estranho. Louco. Difuso. Apraz-me tentar encontrar-te o fio da meada.
Seduz-me obedecer-te. Estranhamente.
E obedeço. Cumpro. Deixo que me leves. Que me coordenes os movimentos.
Ris. Rimo-nos.
Nus. Crus.
E caem por terra todas as premissas.