26 de março de 2014

"Lá porque estou vacinada contra a dengue não me vou oferecer aos mosquitos,
dizes tantas coisas só tuas e a puta da minha sorte por te ter aqui, amei-te antes de saber  e se calhar é só assim que se ama, sei lá, digo eu, que antes de ti pensava na impossibilidade de uma boca assim,
na primeira vez em que dormimos juntos esquecemo-nos de dormir,
a varanda do meu minúsculo apartamento aberta, o Inverno lá fora e um inferno feliz cá dentro,
tinhas uma caveira a rir estampada nas cuecas, ou então era o meu corpo contente que estava a rir-se e a caveira estava morta como as outras,
éramos proibidos mas amámo-nos à maneira de Deus, até que a morte nos separasse, claro está, o problema é que havia várias mortes para experimentar e é por isso que ainda aqui estamos,
quantas vezes é possível amar-te pela primeira vez?,
quero mais uma, só esta, hoje viemos para um hotel para morrermos melhor,
quero uma cama destas em casa,
e deitas-te,
gosto quando brincas aos adultos comigo, inventas expressões que ninguém faz, falas-me das maiores superficialidades do mundo, a outra que tem um blogue foi ao Brasil, há saldos na Zara,
e o poema está na voz, não no verso,
abraçámo-nos há bocado nas escadas rolantes, posso garantir-te que um casal de adolescentes teve inveja da nossa inconsequência,
quando te abraço espero um abraço, e que sejas tu,
excita-me o nosso tédio, as tuas mãos no pêlo do meu peito,
ser feliz é tão simples, não é?,
vou olhando para ti enquanto te vejo, os teus lábios parecem nuvens quando te olho por cima dos óculos e de uma frase,
lembrei-me hoje de manhã das vezes em que te fiz chorar, e chorei,
sou tão pouco para o teu tamanho, escrevo umas merdas que só eu entendo, e é inexplicável tu seres minha,
um dia candidato-me ao Nobel com a tua pele,
tocar-te fez de mim escritor, e com um bocado de sorte gente,
escrevo para te amar melhor, acho que já escrevi isto mas aqui fica de novo, o mais irónico é que enquanto escrevo sentes a minha falta,
talvez escreva também para saber que me queres, quem sabe?, mas certo certo é que escrevo antes de mais para te levar para a cama, ou pensavas que não?,
podia inventar uma Bíblia só para a minha fé por ti, mas não me livres do mal, ámen,
lá porque estou vacinada contra a dengue não me vou oferecer aos mosquitos,
repetes,
já te disse que sei de cor os teus dentes desalinhados quando sorris?,
temos só esta noite para nos amarmos esta noite,
porque precisei de ti para viver assim?,
há que escolher entre amar e escrever, e eu escolho a ti,
talvez um dia saiba de que lado estás."

Pedro Chagas Freitas

Sem comentários:

Enviar um comentário